Toda a equipe da Igara Moda Arte teve o privilégio de receber, recentemente, a visita do xamã Davi Kopenawa em nossas lojas. Incrivelmente pouco conhecido pela maioria dos brasileiros, Kopenawa é a grande voz dos índios Yanomami aqui e no mundo, e a mais alta liderança indígena do Brasil. Na Igara, o xamã teve a oportunidade de conferir de perto o espaço que fazemos questão de manter para arte indígena brasileira, em particular, e a valorização do artesanato brasileiro , no geral. Lá estão algumas peças de arte indígena do povo Yanomami, que faz trançados delicados de cipó titica em cestarias que amamos.
Para quem também ainda não conhece o grande valor desse homem, Davi Kopenawa nasceu em Marakana, extremo norte do Amazonas, e testemunha há algumas décadas a invasão do território Yanomami por garimpeiros ilegais em busca de ouro, assim como a devastação contínua da Amazônia. Para preservar a cultura e a existência do seu povo, além da saúde da região, este xamã Yanomami abraçou forte essas causas e enfrenta, até os dias de hoje, fazendeiros, comerciantes, garimpeiros e políticos “predadores”.
Entre seus principais feitos, premiados até pela ONU, o líder indígena fundou a Hutukara — uma associação, com prestígio de embaixada, que representa os Yanomami no Brasil, e apoia os da Venezuela; foi a principal liderança na conquista da demarcação da terra Yanomami (maior que Portugal) ; e foi o primeiro índio brasileiro a lançar um livro com o seu ponto de vista, a biografia “A Queda do Céu, Palavras de um Xamã Yanomami” (Companhia das letras, 2015).
A biografia “A Queda do Céu” nasceu a partir de depoimentos do xamã ao antropólogo francês Bruce Albert e foi lançada primeiro na França — onde tornou-se um best-seller— com o título “La Chute do Ciel (Edit PLON/ 2010). A tradução em inglês foi publicada logo a seguir pela Harvard University Press. No Brasil, no entanto, o livro só foi lançado cinco anos depois, o que, por si só, é uma demonstração desconcertante da atenção que os índios recebem no nosso país.
Com um ativismo de mais de 40 anos, Kopenawa conseguiu muitos avanços, mas ele próprio reconhece que eles não são nada perto da dimensão e da velocidade com que o homem branco — ou napë, como são chamados pelos Yanomami — desrespeita os povos indígenas, e devasta a natureza que o abriga e alimenta. Do alto de mais de seis décadas de vida, Davi há muitos anos alerta em inúmeras palestras, entrevistas, discursos e depoimentos, que teme pelo futuro não só dos índios, ou da Amazônia, mas do planeta como um todo.
Segundo o xamã, além da invasão de suas terras e da destruição das florestas, um dos maiores problemas do seu povo hoje são as facilidades da “civilização” que arrancam os jovens índios de suas comunidades. No passado os Yanomami sofreram baixas incalculáveis com doenças trazidas pelo contato com “homens civilizados”. Hoje, as aldeias indígenas se esvaziam e as tradições são enfraquecidas pelo estilo de vida contemporâneo que atrai e manipula seus jovens com celulares, TVs, internet, carros e bebidas alcoólicas.
O xamã Yanomami é uma testemunha ocular de que a ganância e a ambição dos “napës” não desaceleraram na proporção da informação que o mundo já tem sobre os danos ambientais causados ao planeta. Quem acompanha sua trajetória, sabe bem que Davi sempre alertou — com gravidade — que a última grande briga da humanidade será por água. Como ele costuma sempre reafirmar, “o homem branco esquece que planeta só existe um!”
Davi Kopenawa esteve no Rio para uma conversa aberta com o público no Espaço Cultural BNDES, durante a programação da exposição do artista visual, poeta e músico Cabelo, Luz com Trevas, com curadoria da crítica de arte Lisette Lagnado. A expo fica aberta até o próximo sábado (11/5) com entrada franca.
Foto do topo: Nossa curadora Ely Lima, o xamã Davi Kopenawa e nosso gestor Eduardo Moreno.